Artigo Nº 357 – NO SFI, NÃO PAGOU, PERDEU

Adquirentes de imóveis com crédito do Sistema Financeiro Imobiliário (não confundir com o SFH) devem ficar atentos ao acórdão da 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (n. 99359), que decidiu em favor de construtora em ação de reintegração de posse, não obstante os fortes argumentos levantados pelo tomador do financiamento.

Como explica o relator, desembargador José Carlos Dalacqua, a ação de reintegração de posse foi movida com base na Lei 9.514/97 (art. 26), que rege o sistema financeiro imobiliário, facilitando a aquisição de imóveis com empréstimos garantidos por alienação fiduciária, sendo contestada pelo réu sob a alegação (entre outras) de que a execução e o leilão extrajudiciais seriam inconstitucionais e que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) seria aplicável ao caso concreto.

Na apelação, o réu sustentou ainda que não teria sido observada a função social do contrato, tampouco a boa-fé contratual, que a lei é inconstitucional, que está em conflito com o art. 620 do Código de Processo Civil (CPC) e assim por diante.

Em seu voto, o desembargador José Carlos Dalacqua refutou exaustivamente todos os argumentos. Demonstrou, de início, que “a finalidade perseguida com a edição da Lei n. 9.514/97 (…) visa proteger o Sistema Financeiro Imobiliário e o de Habitação como um todo, garantindo que o fluxo de recursos para os programas de casa própria não fiquem estagnados (…) ou seja, prestigiando os bons pagadores em detrimento dos maus pagadores”.

O relator cita decisão do Superior Tribunal de Justiça, relatada pelo ministro Ilmar Galvão (recurso extraordinário n. 223.075-1/DF), que, de forma didática, demonstra que “no procedimento judicial, o receio de lesão ao direito do devedor tinha prevalência sobre o temor de lesão ao direito do credor. Adiava-se a satisfação do crédito, presumivelmente líquido e certo, em atenção aos motivos de defesa do executado, quaisquer que fossem”. Com a nova lei, porém, “inverteu-se a ordem, deu-se prevalência à satisfação do crédito, conferindo-se à defesa do executado não mais condição impediente da execução, mas força rescindente, pois, se prosperarem as alegações do executado no processo judicial de imissão de posse, desconstituirá a sentença não só a arrematação como a execução, que a antecedeu”. Por isso, “a venda efetuada pelo agente fiduciário” mostra-se como “meio imprescindível à manutenção do indispensável fluxo circulatório dos recursos destinados à execução do programa da casa própria…”

Concorda o relator: “Desta forma, resta claro que a função social do contrato foi observada, pois houve a proteção dos interesses da coletividade.”

Quanto ao choque da lei com o artigo 620 do CPC – por ser mais gravosa para o executado, quando comparada com qualquer outro meio –, o relator diz que “inexiste o alegado conflito, pois, pelo princípio da especialização deve prevalecer a Lei n. 5.514/97”, que disciplina “especificamente” o sistema de financiamento imobiliário.

Participaram do julgamento os desembargadores Carlos Mansur Arida (presidente, sem voto), Ruy Muggiati e o juiz convocado Luis Espíndola. Íntegra disponível no site do TJPR ou www.bonijuris.com.br.

Perguntar não ofende: Se as cooperativas habitacionais adotassem filosofia mais próxima da decisão acima, estimulando o “fluxo circulatório” de seus recursos, não cumpririam com mais eficácia seu objetivo de propiciar casa própria para pessoas de baixa renda?

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.