Artigo Nº 349 – SEM DIREITO DE INTERFERIR

Locatários, inquilinos ou arrendatários são bem-vindos no condomínio. Seja o edifício residencial ou não residencial, ao firmarem o contrato de locação e ingressarem na comunidade condominial, passam a gozar de amplos direitos, mas não de todos os direitos. Na prática, poucos são os conflitos gerados em razão de não serem titulares do domínio.

Algumas restrições legais ou convencionais se aplicam ao não proprietário, como se vê de decisão prolatada pela 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao julgar apelação movida por locatários de loja localizada no andar térreo de edifício, inconformados com a colocação de grade na faixa frontal do prédio em deliberação aprovada por reduzido número de condôminos.

Segundo expõe a relatora do acórdão (n.70039013859), desembargadora Nara Leonor Castro Garcia, os donos da pizzaria localizada no rés do chão do prédio buscaram na justiça a anulação da assembleia que determinara a substituição de floreiras por grades, por terem ficado prejudicados com a modificação, que dificultava o fluxo de seus clientes.

Em contestação, o condomínio alegou não só a falta de relação jurídica com o locatário, por não ter sido parte do pacto locatício, como também “a ilegitimidade ativa do locatário para a anulação de decisão em assembleia de condôminos”. Justificou, ainda, que a área fechada pelas grades é comum de todos mas estava sendo utilizada como estacionamento, que o proprietário do imóvel locado aprovara a alteração e que as grades seriam necessárias para a segurança geral, acrescentando haver “novos locatários que ali se estabeleceram exatamente em virtude da existência da grade”.

A questão parece banal mas está cada vez mais presente no cotidiano da vida urbana no país, em que valores como estética, comodidade, acesso a edificações e a lugares públicos, circulação de pessoas, relacionamento pessoal e outros são sacrificados em nome da segurança ou da sensação de segurança, síndrome que eclipsou o sentimento de liberdade pessoal e coletiva – mas este comentário não faz parte do acórdão gaúcho. 

Em seu voto, a desembargadora Nara Garcia diz que “a ilegitimidade ativa para a nulidade das deliberações” da assembleia geral extraordinária do condomínio “é induvidosa, uma vez que se constituem locatários e não condôminos”.

Nesse sentido, transcreve trecho da sentença de primeiro grau, proferida pelo juiz Murilo Magalhães Castro Filho, na qual o magistrado assevera que “não possuem os demandantes legitimidade para arguir a nulidade” de reunião assemblear, porque “o ato é realizado entre os condôminos” consoante a convenção do condomínio, sendo tanto a assembleia geral ordinária quanto a extraordinária “soberana para resolver assuntos de interesse geral constantes da ordem do dia”.

Na sequência, fulmina a relatora: “Assim, sendo de interesse dos condôminos a colocação de grades na parte frontal do prédio em questão, descabe aos locatários pleitear judicialmente a nulidade do ato, sob pena de ofensa à soberania da assembleia.”

Conclusão: o locatário pode até participar de certas deliberações do condomínio, se o condômino-locador não estiver presente, mas não pode interferir no resultado.

Votaram com a relatora os desembargadores Cláudio Augusto Rosa Lopes Nunes e Pedro Celso Dal Prá. A íntegra do aresto está disponível no site do TJRS ou do Instituto de Pesquisas Jurídicas Bonijuris (www.bonijuris.com.br).

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 3224-2709, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.