Artigo Nº 282 – MENTIRA NÃO CAUSA NULIDADE

A outorga uxória é necessária para garantir a validade da fiança. Quando o fiador ocultou, no ato da fiança, a situação de casado e se qualifica como separado judicialmente, não pode, na execução do contrato, alegar a nulidade da fiança, por ser casado.

A decisão é da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Alçada de Minas Gerais (acórdão n. 53347, processo n. 0362832-4), relatada pelo juiz Alvez Leite Machado. Além de fazer justiça a um proprietário de boa-fé, serve também como alerta para administradores de imóveis que enfrentam diariamente a intrincada e arenosa questão do estado civil de pretendentes à locação e seus fiadores.

O que fazer diante de um fiador que alega ser solteiro ou divorciado, mas que não prova que não vive em união estável com outra pessoa? Aceitá-lo simplesmente como fiador, correndo o risco de uma decisão desfavorável, rejeitá-lo com receio de ser acionado pelo locador por negligência na seleção do garante, ou exigir que declare expressamente que não tem um companheiro ou companheira?

Antes da resposta, vejamos alguns detalhes da decisão unânime da justiça mineira.

Relata o juiz Valdez Leite Machado tratar-se de apelação contra sentença que julgara improcedentes os embargos à execução propostos pelo fiador contra o senhorio de seu afiançado. O fiador invocou a nulidade da fiança, por não contar com a outorga uxória, informando que se identificou como separado judicialmente, por ocasião da assinatura do compromisso de fiança e que assinou tudo em branco.

Em contra-razões, o senhorio sustente que não pode o fiador invocar em próprio proveito a falsa declaração de separado judicialmente, para pretender anular a fiança que lhe foi prestada, embora seja casado até o presente. 

Esclarece o relator: “Antes da Constituição da República de 1988, os direitos e deveres do marido e da mulher eram discriminados separadamente no Código Civil Brasileiro, constante expressamente a proibição para o marido de prestar fiança, qualquer que fosse o regime de bens, sem a participação da mulher, conforme o artigo 235, inciso III, do Código Civil, mas este dispositivo perdeu sua força, com o estabelecimento da igualdade de direitos entre marido e mulher, mas se garantindo à mulher defender a meação.”

E fulmina: “No caso dos autos, repita-se, o embargante criou o vício no contrato, não podendo agora aproveitar-se deste vício, em face do seu comportamento torpe. A penhora deve prevalecer, como acima exposto, respondendo o embargante pelo ônus da sucumbência, como consta da sentença.”

Votaram com o relator os juízes Belizário de Lacerda, Beatriz Pinheiro Caíres e Dídimo Inocêncio de Paula.

Respondendo, então, as perguntas do terceiro parágrafo, podemos dizer que os administradores de imóveis não devem se atemorizar diante de um fiador que não é casado legalmente, nem perder a oportunidade de fazer a locação, porém é de todo conveniente que incluam uma cláusula no contrato ou no termo de fiança, na qual o fiador solteiro ou separado declare expressamente seu estado civil e que “não vive em estado de união estável” com qualquer pessoa. Se mentir, dificilmente poderá anular a fiança, como visto na decisão acima.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41) 224-2709, fax (41) 224-1156, e-mail lfqueiroz@grupojuridico.com.br.