Artigo Nº 115 – CONJUNTO PODE VIRAR TABELA

Há dias conversando com a advogada Máriz Mendes May, ex-companheira de lides jurídicas, chamava ela a atenção para o agravamento da crise de imóveis de baixa renda financiados por agentes econômicos e sociais do governo, com um aumento considerável da inadimplência, que está levando à favelização de inúmeros conjuntos residenciais em todo o país.

Segundo a advogada, a melhor maneira de romper o círculo vicioso em que nos encontramos é “facilitar a transferência dos financiamentos”. Da maneira em que as coisas estão hoje, diz, em alguns conjuntos populares mais de 50% dos moradores não são mais proprietários, não tendo nenhum vínculo ou compromisso com o agente financeiro que financiou e continua financiando as unidades residenciais.

Para ela, a proliferação dos contratos de gaveta é altamente prejudicial aos interesses da sociedade, pois cria relações jurídicas instáveis, desestimula o pagamento das prestações do financiamento, enfraquece o interesse em arcar com os ônus de manutenção do patrimônio, através da realização de obras pelo condomínio. Quem é mero possuidor, com apenas um papel particular ou muitas vezes nem isso, lembra, não mostra o mesmo empenho dos proprietários titulados em defender o imóvel.

Tornou-se comum, lembra a bacharel, a transferência do contrato de gaveta para uma segunda, terceira ou mais pessoas, de modo que desaparece até  o vínculo de conhecimento e memória entre o proprietário original e os últimos possuidores.

Também esvai-se o compromisso assumido perante os agentes financeiros (Caixa, Cohabs, bancos estaduais), já que os novos possuidores lá não comparecem para renovar sua obrigação, não por que não queiram em sua maioria, mas porque tantas são as dificuldades e os custos impostos que poucos enfrentam o desafio. A pessoa deveria ir até a Cohab, por exemplo, enfatiza Máriz May, mostrar alguns documentos, pagar uma taxinha mínima, e assinar o compromisso de transferência, sem muita burocracia.

No entender da especialista em Direito Imobiliário, é preciso modificar a mentalidade dos agentes financeiros do país, como, segundo ela, já está acontecendo, em parte, com a Caixa Econômica Federal, que finalmente sentiu o dano que está causando ao país e aos seus mutuários ao impedir, na prática, as transferências de financiamentos, ao gerar prestações totalmente desvinculadas com o valor contratado.

Para piorar a situação, há empresas de habitação popular que se encontram em estado de penúria financeira, tendo interrompido o lançamento de novos empreendimentos e passado a apenas gerir o recebimento de antigos financiamentos, porque deixaram de propor ações de rescisão dos contratos em débito, mesmo que a dívida se acumule por alguns anos, sob o fundamento de que são entidades de caráter social.

A empresa pode ter fim social, argumenta Máriz May, mas se não gerar recursos novos, retomando os imóveis em débito, nunca conseguirá meios para o seu crescimento e para cumprir com sua missão, que é beneficiar um número cada vez maior de mutuários.

Em suma, conclui a advogada, a omissão dos agentes em ajuizar ações de rescisão e sua burrice em impossibilitar a transferência de casas e apartamentos para novos adquirentes, com título definitivo e baixo custo, estão trazendo conseqüências catastróficas para o sistema de moradia de baixa renda no Brasil, ou o início de um perigoso processo de favelização de nossos condomínios populares.

A solução está apontada, basta ouvi-la. P.S. Para trocar idéias com a advogada sobre este assunto, telefone para (041)225-7144.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (041)224-2709 e fax (041)224-1156.