Artigo Nº 83 – HABITE-SE É COISA SÉRIA

Afinal, o que é e para que serve o "habite-se" de uma construção? Como o próprio nome indica, trata-se de uma ordem ou autorização dada pela autoridade competente, geralmente municipal, no sentido de que determinado imóvel novo está pronto e em condições de ser utilizado ou habitado. Seu nome próprio é "Certificado de Conclusão de Obra" ou "Certificado de Vistoria de Conclusão de Obra", conforme a autoridade que o conceda.

Qual a função do habite-se? Seu fim, como facilmente se infere da definição, é assegurar ao cidadão o cumprimento de normas de ordem pública, de modo a propiciar segurança e conforto aos usuários do prédio. Sua expedição pressupõe o atendimento de várias obrigações por parte do construtor, como regularização junto ao Corpo de Bombeiros, concessionárias de água e energia elétrica etc.

Sem o cumprimento dos requisitos legais mínimos exigidos, obviamente, a autoridade responsável não pode aprovar a obra recém concluída, devendo negar o certificado de conclusão. Não sendo concedido, a conseqüência natural é a proibição de que usuários e moradores passem a habitar o edifício irregularmente concluído.

Invasão

No caso do Palace II, pelo que se noticiou, o fatídico arcabouço não recebera o devido habite-se, por falta certamente de condições básicas exigidas, porém vinha sendo habitado há meses pelos condôminos, promitentes compradores e outros interessados. Não se questiona a irresponsabilidade da construtora e de outros mais que têm a obrigação legal de zelar pelo bem-estar da população, mas não se pode deixar de indagar por que uma construção sem habite-se foi liberada para a moradia de mais de uma centena de famílias. Disseram que os moradores invadiram seus apartamentos, sem autorização. Se isso aconteceu, por que a construtora, a prefeitura do Rio, o Ministério Público ou outra autoridade qualificada não tomaram providências para regularizar a situação?

Não adianta chorar depois de derramado o leite, diz a sabedoria popular. O problema do Palace II será enfrentado, com mortos e feridos, na Justiça daquele Estado. O que nos preocupa, e nos chamou a atenção para o tema, é a verdadeira desmoralização que o certificado de conclusão de obras tem tido em nossas cidades. Ao invés de ver o habite-se corno um salvo-conduto, nossos construtores e a população em geral o vêem como um entrave. Não são poucas as pessoas que a ele se referem com desdém ou que pouco caso fazem de sua existência ou não, utilizando os imóveis recém-construídos quer tenham ou não o habite-se.

Nova postura

Não dispomos de estatísticas para oferecer ao leitor, mas contamos com sua ajuda. Pense um pouco e analise: você, pessoalmente, não tem conhecimento de vários casos de pessoas que se mudaram para suas casas ou edifícios sem que a construção tivesse recebido o pode da prefeitura? De outro lado, soube que alguma vez algum representante do poder público tomou alguma medida visando evitar ou impedir a utilização indevida de uma edificação por falta de habite-se?

Se existe norma que coage as partes a construir segundo padrões mínimos de segurança e que condiciona a habitabilidade do prédio à satisfação de requisitos técnicos, tal preceito deve ser rigorosamente obedecido, para que novas tragédias sejam evitadas.

Está na hora de se voltar a dar valor ao habite-se, portanto. É uma postura que se exige tanto dos construtores e incorporadores, como do poder público (todas as autoridades competentes, incluindo o CREA), como dos adquirentes das unidades e seus futuros condôminos.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (041)224-2709 e fax (041)224-1156.