Artigo Nº 242 – CAIXA SEM PREFERÊNCIA

As cotas condominiais estão umbilicalmente ligadas à sobrevivência (leia, manutenção) da comunidade em seu contexto geral, não podendo prescindir do seu recebimento, sob pena do efetivo comprometimento daquele universo, que, sob esse prisma, não objetiva qualquer lucro ou vantagem, constituindo-se, pois, numa contraprestação relacionada à usufruição dos serviços disponibilizados pela estrutura condominial.

O parágrafo acima, de magistral clareza, foi extraído de acórdão (n. 02003165-2) do Tribunal de Alçada do Paraná, relatado pelo juiz Guido Döbelli, no qual a 10a. Câmara Cível julgou recurso de agravo de instrumento (seguido de agravo regimental) da Caixa Econômica Federal, em que requerera a primazia na satisfação de seu crédito hipotecário em face de dívidas de condomínio.
           
Controvérsia
   
Como explica o relator, inconformada com a penhora realizada pelo condomínio sobre a unidade autônoma do proprietário, em ação de cobrança, a Caixa peticionou pugnando pela instauração de “concurso particular de preferentes” na forma do artigo 709 e seguintes do Código de Processo Civil, já que seu crédito atingia montante superior ao do valor de mercado do imóvel. Com isso, queria garantir sua prioridade na satisfação do débito hipotecário que pesa sobre a unidade. Seu pedido foi negado.

Vencida nos embargos declaratórios, agravou de instrumento visando evitar que o bem fosse a leilão (praça), na ação de cobrança. Nas palavras do juiz Döbeli, o ponto controverso cingia-se ao “reconhecimento da preferência do crédito hipotecário independentemente de execução ou penhora, com sua decorrente habilitação para o exercício desta primazia em procedimento alheio, movimentado em razão de inadimplência de cotas condominiais”.

Como bem nota o magistrado, o crédito hipotecário, no caso, encontrava-se vencido desde 1996, acumulando prestações que em 2001 alcançavam perto de R$ 300 mil reais, “não tendo a CEF sinalizado com qualquer medida judicial ou extrajudicial para o recebimento do débito”. Nesse sentido, “a almejada admissão da CEF neste procedimento em que se busca o resgate de dívida propter rem, além de representar um prêmio à inércia da referida credora hipotecária no respeitante a incompreensível ausência de iniciativa para o recebimento de seu crédito há muito vencido, significaria fragilizar a efetividade do procedimento movimentado pelo condomínio”.
           
Pressuposto
   
Adiante, em sua argumentação, o relator diz que “oportuno se faz destacar que em ambiente de convivência condominial, a proteção ao interesse coletivo prevalece e faz suplantar o do particular”.

No mesmo sentido, sublinha que, no caso, há “interesse de toda uma comunidade dependente da contribuição individual de cada um de seus integrantes para sobreviver e manter em funcionamento sua estrutura (sem qualquer conotação de lucro, vantagem econômica ou de subsídio, incentivo ou fundo especial para suprir a inadimplência) versus o interesse de uma instituição financeira” que agiu com negligência.

Acompanharam o voto do relator os juízes João Kopytowski e Carlos Mansur Arida.

Decisão no mesmo sentido do STJ (Resp 32.881-SP), citada no acórdão, também deixa bem claro que “o concurso de credores previsto nos arts. 711 e 712 do CPC pressupõe execução e penhora do credor que alega preferência, já que não basta por si só o fato de ser credor hipotecário”.

Luiz Fernando de Queiroz é autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB, fone (41)224-2709, fax (41)224-1156, e-mail lfqueirozadv@softone.com.br.